PARASHAT VAERÁ
B”H
Parashat Vaerá (Shemot 6:2-9:35)
A Parasha nos relata que HaShem manifesta o Seu Nome a Moshe e recorda da Aliança feita desde Avraham Avinu e promete que cumprirá Sua Palavra retirando os Benei Yisrael de Mitsraim com grande poder para levar todo Am Yisrael para a terra da Aliança. Contudo os Benei Yisrael não escutaram a voz de Moshe por causa das cargas que lhes foram acrescentadas. HaShem ordenou então a Moshe e a Aharon sobre os Benei Yisrael, e deu-lhes mandamento, estatuto a eles e a Faraó, para que retirem o povo do Egito.
Portanto, HaShem declara que endurecerá o coração de Faraó e multiplicará os seus sinais pelo Seu poder, para que todas as nações da terra saibam que só o Eterno é verdadeiro D’us e domina sobre todos os povos. Moshe chega à presença de Faraó e lhe expõe sinais sobrenaturais, mas ele não lhe dá ouvidos. Na manhã seguinte o adverte e com seu cajado fere as águas do Nilo que se transformam em sangue dando início assim a primeira praga, todas elas não irão afetar os Benei Yisrael negativamente.
Assim as águas do Nilo, de poços ou em jarros dos egípcios se transformam em sangue impedindo a população de saciar sua sede. Após sete dias, Moshe dirige-se a Faraó e informa sobre a invasão de rãs por toda a terra. Faraó se nega em atender e desta forma centenas de milhares de rãs cobriram toda a terra de Mitsraim. Faraó manda chamar Moshe e lhe roga para orar ao Eterno que afaste as rãs, pois libertaria em seguida o povo. Faraó fixa o dia do livramento da peste e tendo ocorrido o milagre, seu coração se endureceu e não cumpriu o seu dito. HaShem então manda a terceira praga, infestando as pessoas e os animais de piolhos e todo o Egito sofre com esta terrível praga, contudo Faraó permanece obstinado e não permite a liberdade de Am Yisrael. Moshé mais uma vez o adverte com a quarta praga, onde viria sobre o Egito uma diversidade de animais selvagens que assolaria a nação mas Faraó permanecia irredutível e obcecado em não abrir mão dos escravos em Nome do Eterno, D-us Altíssimo.
Depois de muito sofrimento, Faraó diz que libertaria o povo, e tendo se livrado do mal, mais uma vez não cumpre com sua palavra. Moshe avisa dos riscos sobre um novo sinal destruidor, onde uma grande epidemia viria sobre o gado e mesmo com este sinal, Faraó manteve-se impassível. A próxima praga caiu sobre o Egito em forma de sarna e úlcera, mas tendo sofrido, Faraó ainda permaneceu com coração rígido e contumaz. Moshe anuncia a vinda de chuva de granizo e fogo, o que causaria terríveis prejuízos, mas isso contudo, não o sensibilizou. Mais uma vez pede o afastamento do flagelo, pois retrocederia e libertaria Am Yisrael para o seu D-us, no entanto, mesmo vendo o Egito arruinar-se a passos largos, Faraó não cumpre sua promessa expondo todo Mitsraim a mais desastres e juízos vindo da parte de D’us.
“E falou Moshe assim aos Benei Yisrael e não escutaram Moshe por causa da angústia de espírito e pela dura servidão;” (Shemot 6: 9). A princípio os Benei Yisrael acreditaram que o Eterno visitara Seu povo e que se cumpriu finalmente a hora da redenção, para herdarem a terra da Aliança profetizada aos pais. No entanto surgiu o primeiro obstáculo, quando os Benei Yisrael se encontraram em uma situação complicada e quando lhe apareceu diante dos olhos, o inverso de suas expectativas de liberdade, eles passaram à disposição espiritual da incredulidade, não mais aceitando a redenção nem reconheceram a legitimidade da liderança de Moshe.
O que a Parasha nos ensina hoje?
Vemos no início desta Parasha que os israelitas trocaram o foco da redenção, alimentado pela esperança do cumprimento das profecias, pelo espírito de fracasso, derrota e frustração, pois buscavam refrigério das acrescentadas cargas e almejavam uma forma para suprir suas necessidades imediatas. Assim os problemas superaram em importância diante das suas expectativas e esperanças de redenção. Isto vem a ser exatamente o que representou o êxito do plano de Faraó, em despersuadir o povo de D’us em relação a redenção. As palavras do texto: “kotser ruach (espírito de angustia) e avodá cashá (dura servidão), nos remete a um sentido mais profundo. A angustia e fadiga, expressos no texto, representam os primeiros obstáculos que enfrentamos quando estamos na trajetória de alcançar um propósito Divino ou um objetivo real para nossas vidas. Este ato de se abalar e de se angustiar por causa da fadiga ou frustração, será repetido inúmeras vezes após a redenção, quando Am Yisrael estiveram peregrinando no deserto e provaram ao seu D’us por diversas vezes. Muitos naqueles dias, julgaram que deveriam receber de imediato o que suas necessidades exigiam.
A Torah nos diz que estas disposições implicam em rebeldia e desobediência, as quais desestruturam a emuná (fé) e contaminam todo ambiente, por não se manterem perseverantes e aceitarem a soberania Divina. Muitas vezes estamos passando por momentos similares onde necessitamos ou esperamos algo, no entanto ao invés de recebermos ou alcançarmos tais brachot, contemplamos atônitos o distanciamento progressivo do que almejamos, com mais e mais barreiras a serem suplantadas. Estando como no deserto, podemos correr diversos riscos, no entanto devemos estar cientes de que D’us é fiel e tem zelo pela Sua Palavra e cujas promessas não abandonam o Seu povo. Mas também existem ocasiões onde se alimenta expectativas firmadas em supostas promessas Divinas, que não correspondem e não irão ocorrer, e isso também pode causar os mesmos sintomas, implicando em um processo de degradação da emuná, e se não for estancada a tempo, se estenderá até a sua destruição total. Cabe então ao homem estar em sintonia fina com o Eterno através da tefilá, da kedusha, do estudo da Torah e discernir o que realmente procede de HaShem e o que é fruto dos desejos ou manipulações humanas.
O processo da queda pode iniciar-se da seguinte forma: a princípio surge uma simples incompreensão que se arrasta à um estado de questionamentos que nunca são satisfeitos, pois estão destituídos da ideia da soberania de D-us. Este estado pode levar as práticas de lamentações e murmurações. Nesta etapa está presente a ingratidão e existe uma inversão de valores, se confunde o bem com o mal. Assim a presença de D’us na aflição passa a ser o mal, ou seja, não se consegue enumerar nada de positivo quando se encontra na tribulação e nenhum motivo existe para o agradecimento a D’us.
Contudo no passado, consegue-se enumerar os aspectos positivos, mesmo em meio aos sofrimentos, com ausência da presença de Divina, assim como foi no deserto: “(...) e os Benei Yisrael tornaram a chorar e disseram: Quem nos dará carne a comer? Lembramo-nos dos peixes que no Egito comíamos de graça e dos pepinos e dos melões e cebolas e dos alhos. Mas agora a nossa alma se seca, coisa nenhuma há senão este man (maná) diante de nossos olhos” (Bamidbar 11: 4-6). Aqui encontramos a memória do cativeiro, onde só são recordados os aspectos positivos, entretanto no presente, é exacerbado o lado negativo da espera e da submissão da vontade de HaShem.
Assim, destacamos uma tradução livre da frase do livro "The Garden of Gratitude" Rabbi Shalom Arush, Yeshiva Chut Shell Chessed – Jerusalém: “Fé e ingratidão se excluem mutuamente”. O próximo passo rumo à decadência espiritual, projeto de Faraó, é a angustia que se instala no coração, desprovido de confiança total em D’us. Surge assim após o esforço de lutar e se desgastar, tendo visto, o seu objetivo cada vez mais longe. O termo “kotser ruach” traduz em “horizonte estreito” ou “espírito limitado”. A angústia, como parte presente e atuante, ela limita e restringe o poder da ação e reação do homem, desgastando a ideia da perseverança e entrega total ao Kadosh Baruch Hu.
A angustia deixa o homem amargurado, e extremamente crítico, com efeito, vulnerável ao sistema maligno que o leva a falta de esperança, derrota e até auto piedade. Com a fadiga, surge então a apatia, o descomprometimento e o abandono, que gera a insensibilidade, o esfriamento da fé e incredulidade. Muitos assim com o coração machucado, projetam toda a culpa no líder, como ocorreu diversas vezes com Moshe Rabeinu. Estes lançam a responsabilidade do erro sobre as comunidades de fé que frequentam, transferindo-se de sinagoga a sinagoga, procurando sempre, sem encontrar, pois não se submetem a vontade Divina, mas querem que as pessoas e D’us se submetam a sua vontade e seu ego. Muitos ainda transferem a culpa, que HaShem não permita, até mesmo no próprio D’us. Muitas pessoas entram neste processo sutil e maligno, por não reconhecerem a Natureza Divina, nem perseverarem em sua emuná.
Contudo, existem aqueles menos avisados, que se envolvem com promessas diversas, e em especial de prosperidade, como se conseguissem alcançar o favor de D’us através de “sacrifícios”. O espírito angustiado e a fadiga no âmbito espiritual são decorrentes da frustração e desanimo, por não esperar com paciência a soberania do tempo de D-us, como foi o caso dos Benei Yisrael neste episódio. Superar estes momentos críticos, mas necessários para o crescimento espiritual, representa defender e fortificar a emuná e obter experiências de vida que irão robustecer a neshama ao longo da caminhada. Assim devemos estar atentos e perseverantes para não entrar em um processo degradante, que se inicia com um simples questionamento e incompreensão, passando pela murmuração e angústia e que pode desembocar para a crítica exacerbada, e por fim na rejeição e repugnância de tudo que se refere ao âmbito de fé. A perca da fé implica também na degradação dos valores, morais e espirituais, pois, na concepção profana, se não há o favor Divino, por que buscar a santidade? Se este D-us não me dá aquilo que eu quero, porque vou servir a este D-us? Se Yeshua levou sobre si as minhas enfermidades, porque estou ainda enfermo? Muitos então, sem compreender a soberania e os propósitos Divinos, se descambam para uma vida profana, vivendo por seus instintos e prazeres carnais, esquecendo-se totalmente de D’us.
Portanto, há uma urgente necessidade de se manter em um estado de perseverança, fidelidade e agradecimento a D’us por meio de Yeshua HaMashiach; esperando o tempo adequado, para que Ele possa agir. Foi o que ocorreu no texto de nossa Parasha, onde em seguida, com a praga do sangue sobre toda a terra de Mistraim, os Benei Yisrael, segundo relata nossa tradição, deixaram de trabalhar arduamente, e até mesmo se beneficiaram financeiramente em decorrência das diversas pragas, que se estenderam por meses em todo Mitsraim. Até que finalmente veio a redenção e a retirada de todo Am Yisrael, que despojou o Egito e foram libertos para serem servos do D’us Altíssimo, rumo à Érets e ao Sinai, para receberem a Torah.
Rosh Yossef Chaim (Maurício) – B'rit Olam.